Efeito borboleta
Algumas décadas atrás o governo de Bornéu criou um programa de saúde pública usando DDT, poderoso e controverso inseticida, para eliminar o mosquito Anopheles transmissor do parasita da malária, doença que desde os tempos primitivos flagela a espécie humana e que muitas vezes é fatal. Realmente a malária diminuiu, mas alguns efeitos colaterais inesperados surgiram.
Primeiro os tetos das casas começaram a desmoronar, pois o veneno também matou as vespas predadora de lagartas e essas aumentaram tanto que alem de arrasar as lavouras atacaram até o teto de palha das casas dos nativos.
Os Geckos, um tipo de lagartixa da ilha que se alimenta basicamente de moscas, começaram a morrer por causa do veneno encontrado nelas, os gatos que gostam de saborear esses reptilianos morreram em grande quantidade.
Sem gatos, os ratos proliferaram rapidamente, pois têm até vinte e quatro filhotes a cada dois meses. Com a falta de alimento, as lagartas haviam comido as lavouras, a massa de ratos começou a invadir as casas a procura de alimento levando junto as pulgas que são hospedeiras do temível bacilo da peste. Como todos sabem no século XIV a Peste Negra, como ficou conhecida, dizimou de 25% a 35% da população mundial da época, algo próximo de 75 milhões de pessoas segundo algumas estimativas.
Assim um programa que visava controlar uma epidemia de malária deu início a outras duas piores. Porque além da peste o tifo transmitido pelas mesmas pulgas também atacou a população.
Para resolver a enrascada tiveram uma idéia luminosa: Lançaram de para-quedas uma imensa quantidade de gatos sobre a ilha, depois de algum tempo a população de ratos voltou a normalidade e todos aprendemos uma lição.
A Natureza tem um equilíbrio perfeito, porem delicado. O homem é o único ser que tem o poder de destruir esse equilíbrio, e sempre que isso ocorre o próprio homem também é prejudicado.
E o que tem essa história com a saúde pública no Brasil?
Se lá em Bornéu a interação da natureza não foi levada em conta ao ser criado o programa de combate a malária. Aqui no Brasil o “paciente” está sendo visto e cuidado pela medicina como um conjunto de partes estanques, cada uma com seus problemas específicos e com seu especialista, como se o organismo humano não fosse um todo que interage continuamente.
O sistema está desvalorizando os médicos generalistas, e sobrecarregando os especialistas com problemas que teoricamente poderiam ser resolvidos logo na consulta da atenção básica se esta fosse realizada a contento.
Exemplo emblemático são os casos de enxaquecas, que em grande número são consequência de problemas de oclusão ou de articulação mandibular, e que são encaminhados erradamente a “neuros” e outros especialistas que solicitam vários exames em que os resultados, na maioria das vezes, estão todos dentro dos padrões de normalidade.
Se esses casos tivessem sido avaliados por um bom clínico, ele teria simplesmente indicado uma avaliação odontológica, resolvendo o problema do paciente e minimizando o do sistema de saúde como um todo.
A maioria das consultas ambulatoriais no sistema público brasileiro são realizadas sem anamnese, sem exame físico, sem que o médico “toque” no paciente, ele simplesmente diz o que sente e o médico entrega a receita, a lista de exames a realizar e/ou o encaminhamento a um ou mais especialistas.
Se lá em Bornéu conseguiram resolver o problema, aqui parece estar cada vez mais longe uma solução. O ser humano continua sendo dividido e cada vez mais em pedaços menores, uma verdadeira festa para os especialistas.